quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

A dança na magia: ritual, celebração e expressão

por Roberto Bríd Ártemis
[as ideias e opiniões expresssas no texto são de responsabilidade do autor]

Introdução
A Dança nasce da simples ato de se movimentar, tudo está em algum ritmo, e a dança nos ensina que cada ser possui seu ritmo individual, sincronizar vários seres em um mesmo ritmo é outra atividade que nos ensina a trabalhar em grupo e exercitarmos nossos laços uns com os outros. O ser humano procurava modos de se relacionar com a natureza e essa relação era ainda mais estreita com os animais, Animismo como uma das primeiras formas de espiritualidade da humanidade deixou marcado em nossa história a importância dessa relação com os animais, o ser humano começa a estudar os movimentos dos animais e como forma de se aproximar deles começa a reproduzir os movimentos que consegue adequar as suas possibilidades corporais, é possível que acreditassem que isso poderia atrair para eles as qualidades daquele animal e uma boa relação com os “espíritos animais”, crença que tem relação com a dança dentro de outra espiritualidade também antiga: o xamanismo. Segundo dados antropológicos o animismo antecedeu o xamanismo e a crença nas potencialidades dos animais e que construir uma boa relação com eles era algo de fato bom (uma vez que o ser humano temia várias outras espécies por possuírem mais força física) sofreu uma mutação transformando-se numa crença em “espíritos animais”, os praticantes de xamanismo  não praticavam uma dança tão primitiva quanto os animistas, pois a musica havia sido descoberta e percebida de varias maneiras, os xamãs se dedicaram ao exercício de sincronia entre o movimento e a música, acreditavam que essa era uma das melhores formas de se comunicar com os espíritos e com a natureza. A dança não é apenas movimentos rítmicos ao som de uma música, ela teve sua origem apenas como movimento e um movimento não só humano, toda natureza dança isso pode ser percebido não só na fluidez de alguns elementos, mas na rotação dos planetas, no movimento espiralado da sincronia entre as orbitas planetárias, desde coisas grandiosas às batidas de nossos corações e movimento das nossas hemácias e células. A dança simplesmente existe, o movimento simplesmente flui e ganha um ritmo.

A Dança como Expressão
A expressão é o que torna a dança uma forma de comunicação e por isso atualmente os cursos de graduação em dança é rotulada não somente como forma de arte, mas também como uma técnica de comunicação. A melhor palavra para definir essa técnica comunicativa é expressão. Interessante as universidades incluírem a dança nos ramos da comunicação uma vez que os seres humanos primitivos acreditavam que podiam se comunicar com espíritos por meio da dança, contudo, a dança com certeza pode ser um instrumento de transmissão de uma mensagem, conto, relato, história e até de um sentimento, uma poesia sem palavras, ou até mesmo ser uma arte abstrata que cada pessoa pode entender ao seu modo. O ser humano primitivo imitava os movimentos dos animais, esse é um claro caso de expressão, basicamente estou sendo aquele animal que imito, estou passando para os que me assistem a imagem daquele animal, estou expressando uma figura.

A Dança como Ritual

A dança primitiva se baseia no instinto. No período Paleolítico a dança costumava ser utilizada para entrar em estado de transe, e os movimentos ritualísticos eram executados com a inclusão de animais, roupas especiais e mascaras (que posteriormente foram substituídas pela maquiagem nos costumes de alguns povos). No período Neolítico da pré-história o ser humano passa de predador a produtor, esse fator influenciou em diversas áreas e inclusive na dança que passou de movimentos ritualísticos para movimentos cerimoniais (isso não extingue o caráter ritual dessa dança), características que ficam bastante evidentes ao nos reportarmos a Grécia Arcaica, cuja sua dança, segundo as narrativas lendárias, nasceu em Creta.

Danças Sagradas
Sob o conceito helênico de que a dança foi inventada pelos Deuses, e não somente isso, como também a crença no fato de que os Deuses dançaram, e que isso faz de nós seres que podem dançar com e para os Deuses. Alguns exemplos dessas danças sagradas são: a dança dos saltirines (sacerdotes romanos de Marte) que saltavam para que as plantas crescessem em março; a dança grega Pírrica executada nos festivais a Atena, onde os dançarinos armados representavam suas tribos; esses relatos vão de encontro com o que disse o poeta grego. Consoante Homero:

“A dança foi ensinada aos mortais pelos deuses para que aqueles os honrassem e os alegrassem; foi em honra ao Deus Dionísio que apareceram os primeiros grupos de dança e foram compostos os primeiros Ditirambos”.

Não havia celebração religiosa (ritualística e/ou cerimonial) sem dança, pois esta era o melhor meio de honrar, alegrar e agradar uma divindade. Também se invocavam os deuses por meio da dança em diversas situações como nascimentos, casamentos, mortes, guerras, colheitas, entre outras.

Etruscos

As referências que temos sobre as danças etruscas são embasadas em representações, pois não foram encontrados textos escritos sobre a mesma até hoje. Percebemos que a dança desse povo recebeu uma forte influência dos gregos desde o século VII A.E.C, pelas representações nas quais aparecem indícios de danças guerreiras, dionisíacas, de banquete, entre outras. Os movimentos eram realizados em tempo acelerado, ritmada e acompanhada por aulos e liras.

A Dança dos Orixás

O círculo simboliza os Orixás que estão relacionados aos astros. Os passos e gestos representam a característica do Orixá. Exemplos: A dança de Nanã representa o embalo de uma criança; Oxalá os movimentos do pombo; Oxóssi figura da caça; Inhasã representa em sua dança os movimentos de despachar Egum, dominá-los, espalhar o vento; entre outros. É uma dança representativa de expressão sagrada introduzida na ritualística.

Egito

A dança foi desde muito cedo a maneira de celebrar os deuses do Antigo Egito, ela também divertia o povo e através desse ritual se desenvolveram os elementos básicos para a arte teatral atual. Vinte séculos A.E.C se realizavam no Egito as chamadas danças astroteologias em homenagem ao deus Osíris. 500 anos A.E.C as danças homenageavam também a deusa Hathor, da dança e música, e o deus Bés, que é considerado o inventor da dança (ambos deuses da fertilidade). Para o deus Amon acontecia a procissão da “Barca Sagrada” na qual bailarinos faziam acrobacias. Nos funerais havia os mouou que vinham ao encontro do enterro dançando em duplas, acreditava-se que os movimentos da dança assegurariam a ascensão a uma nova vida para o espírito que partira.

Índia

As danças tem origem na invocação a Shiva (deus da dança). Por meio da dança busca-se a harmonia com a natureza, pois o ritmo da dança está associado à criação contínua do mundo, à manutenção desse mundo, à destruição de algumas formas para o nascimento de outras. O princípio seguido é de que “o corpo inteiro deve dançar”, cada movimento de olhos, pescoço, boca, mãos, ombros e pés apresentam serem muito elaborados. Cada gesto tem um significado místico, afetivo e espiritual. Os gestos das mãos são chamados de mudras e suas danças são chamadas de ragas, cada raga possui suas próprias cores que se referem às lendas, estações do ano e horas do dia.

Índios Brasileiros

Geralmente realizadas individualmente ou em grupo, mas a maioria das tribos não as executam em duplas. As mulheres não participam das danças sagradas executadas pelos Pajés ou grupos de homens. Em algumas danças é adotado o uso de mascaras (ou dominós) que cobrem o corpo todo e servem de disfarce. As danças são sagradas e de grande importância nos rituais, as mais conhecidas são o Toré e o Kuarup. O Toré costuma ser utilizado pela maioria das tribos e apresentas variações de ritmos e toadas, e é executado com uso de chocalhos e organizado em círculo, o Toré é considerado o símbolo maior de resistência e união entre os índios do Nordeste Brasileiro.

Idade Média

A Igreja Católica proibiu as manifestações corporais e associou a dança ao pecado, usou de seu poder para fechar os teatros monopolizando-os apenas para manifestações e festas religiosas, mas a Igreja não conseguiu interferir na dança popular dos camponeses que dançavam nas épocas de semeadura e colheita e no inicio da primavera, para não afrontar a Igreja essa dança era camuflada com a introdução realizada por personagens como anjos e santos, posteriormente esse costume foi incorporado às festas cristãs levando a dança para dentro das Igrejas. Nos séculos XI e XII doenças epidêmicas como a peste negra assolavam na Europa, as pessoas dançavam freneticamente para espantar a morte em meio ao desespero, tal dança recebeu o nome de dança da morte ou dança macabra.


A Dança como Celebração
O ato de celebrar com a dança abraça uma diversidade infinita de possibilidades, nesse caso celebrar seria similar a comemorar, festejar e consequentemente alegrar-se na maioria dos casos, algumas vezes o alegrar-se pode ser substituído por esperançar-se. Podemos usar a dança para celebrar de forma sagrada, dentro de um ritual, cerimônia, festival ou celebração religiosa. Podemos celebrar por meio da dança também os ritos de passagem da vida como aniversários, casamentos, formaturas, promoção profissional, entre outros. E podemos simplesmente dançar para celebrar a vida de diversas formas, seja para comemorar o fato da primavera ter chegado ou o fato de ter sido aprovado em um concurso. Celebrar muitas vezes pode ser um ato de agradecimento inconsciente, você está tão feliz com algo que aconteceu que quer celebrar, ou seja, festejar e comemorar o ocorrido. A dança como celebração também se encaixa em eventos funerários, quando os movimentos nos remetem a esperança e não a tristeza. De forma consciente a dança como celebração pode ser um agradecimento mais intenso comparado a um simples obrigado, ou até a uma poesia inteira que viesse a expressar gratidão.

A Dança e sua relação com a Magia e Espiritualidade

“O seu êxtase irrompeu na única canção de tudo que é, foi ou será, e com a canção surgiu o movimento, ondas que jorravam para fora e se transformaram em todas as esferas e círculos dos mundos.” Starhawk (A Criação - em:  A Dança Cósmica das Feiticeiras)

A relação da dança com a magia é expressiva, sendo assim por meio dela podemos além de honrar os deuses também usá-la em nossos feitiços, geramos uma grande quantidade de energia através da dança, energia essa que pode ser direcionada para o objetivo do feitiço e potencializá-lo carregando-o de poder. Claro que é preciso saber lidar com as energias obter sucesso no feitiço no qual está realizando ou caso contrário a energia escapará do seu objetivo, é preciso haver intenção e concentração nos movimentos, e também uma boa finalização da dança, pois enquanto você está executando os movimentos você está emanando energia, ao finalizar deverá direcionar toda energia emanada para o propósito do feitiço e isso deve ser feito com um movimento de desfecho enfático que concretize de fato o ato mágico. Por isso geralmente usa-se musicas percussivas (som de tambores) para danças de feitiços. Até fora de um local sagrado a dança pode levar seus desejos além e enviá-los ao Universo e aos deuses, ela é uma das expressões da alma, uma antiga e poderosa forma de dizer principalmente o que as palavras jamais serão capazes de descrever.

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Sobre o Autor: Roberto de Souza da Conceição, conhecido entre os pagãos também por Roberto Bríd Ártemis Isis (Lykófos) nasceu em 1991, é natural de Recife-Pernambuco (Brasileiro). Teve seu interesse pelas artes despertados quando ainda criança e tornou-se bailarino aos 16 anos de vida. Conheceu a magia por meio da Wicca aos 13 anos de idade e atualmente exerce o oficio de sacerdote na Tradição Diânica Éfeso de Bruxaria. Estuda Licenciatura em Dança na Universidade Federal de Pernambuco e se aventura como pianista, cantor e compositor amador. É fascinado pela escrita em seus diversos formatos, costuma escrever alguns artigos, mas se dedica com mais ênfase na composição de romances fictícios.


Referências Bibliográficas e Acadêmicas
A Dança Cósmica das Feiticeiras (The Spiral Dance), Starhawk

Marta Claus Magalhães - "A Dança e sua característica sagrada" - Graduada em Filosofia pela UFSJ – Universidade Federal de São João del -Rei.

Juana Albein dos Santos; “Os Nagô e a Morte” – Editora Vozes – RJ, 1975

História da Dança – Rosana van Langendonck. Editora Moderna, SP, s/d.

SEMINÁRIO: BIODANZA NO CONTEXTO HISTÓRICO E ANTROPOLÓGICO DA DANÇA Facilitadora Didata: Lilian Rocha - Alunos e alunas: Adriana Pirola, Ana Maria Fernandes, Helena Beatriz de Oliveira, Iolanda Wawrick, Marlene Teresinha da Silva, Miguel Zanona Krasner, Roseane Sfoggia Sochacki, Simone Baumgarten e Viviane Pereira dos Santos OUTUBRO DE 2012

ARTE Série: 1º Ano  - Ensino Médio, GNU  Free Documentation License, (b) Agência Brazil / Creative Commons Attribution 3.0 Brazil.

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